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Mostrando postagens de 2022

A escuta psicanalítica na clínica do médico de família

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A prática médica contemporânea demanda do clínico mais habilidades de comunicação do que propriamente conhecimentos de fisiopatologia e tratamentos, em especial no contexto da atenção primária à saúde, no qual inúmeras vezes o profissional se depara com queixas de sintomas sem doença orgânica diagnosticável. A escuta psicanalítica não deve ser confundida com a psicanálise em si, haja vista a necessidade de se demarcar adequadamente o que é uma consulta médica e o que é uma sessão analítica. No entanto, esse tipo de escuta na consulta médica permite explorar novas percepções sobre os sintomas e, consequentemente, definir condutas menos medicalizantes.  A vídeo-aula disponível no vídeo a seguir pretende demonstrar como a escuta psicanalítica pode ser aplicada em consultas do médico de família e comunidade, bem como ilustrar alguns benefícios advindos de tal prática. Partindo-se de referenciais teóricos da Psicanálise e da Medicina Psicossomática, precursoras da medicina centrada na pesso

Psicanálise lacaniana, polarização política e armadilhas do ego

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A clínica lacaniana é apresentada como um “retorno a Freud”, notório enunciado do próprio Lacan durante os anos de 1950. Mas, afinal, o que significa essa ideia de retornar a Freud? Busco respostas neste artigo, ao explorar conceitos lacanianos importantes, do modo mais didático possível. Além disso, apresento-lhes uma hipótese que explica em parte a influência marcante de Lacan para a Psicanálise no Brasil, tecendo articulações com questões políticas de nosso país, entre as quais a polarização contemporânea que expôs o calcanhar de Aquiles de muitos analistas. Nos anos que se seguiram ao falecimento de Freud, muitos se propuseram manter vivo seu legado, dando sequência à empreitada inaugurada pelo pai da Psicanálise. No entanto, não foram poucos os que se perderam de princípios freudianos elementares e, em consequência, passaram a praticar “psicanálises” muito diferentes da ensinada por Freud. Foi em tal contexto que Jacques Lacan, percebendo os problemas advindos do distanciamento da

Medicina centrada na pessoa e suas bases na Psicossomática

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Na prática da medicina pós-moderna, muitos continuam a se lançar numa abordagem reducionista, valorizando sobremaneira os aspectos biológicos do processo saúde-doença. Outros, no entanto, já perceberam que para a maioria das situações clínicas com as quais o médico se depara em seu cotidiano, especialmente nos serviços de saúde primários, faz-se necessária uma abordagem que integre a subjetividade dos pacientes ao tratamento. Visando tal abordagem integrativa, a ideia de uma medicina centrada na pessoa veio de Michael Balint e estruturou-se a partir de conceitos psicanalíticos e dos pilares da Medicina Psicossomática. Na esteira de Balint, o médico de família canadense Ian McWhinney e alguns de seus colegas desenvolveram o método clínico centrado na pessoa, ampliando o alcance da escuta qualificada dos psicanalistas para consultas de clínicos gerais e, consequentemente, melhorando habilidades de comunicação. A proposta da aula disponível no vídeo a seguir não é apenas apresentar esse m

Vamos falar d'Isso - um retorno a Groddeck

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Falar do Isso é falar disso que nos afeta enquanto seres humanos, os únicos viventes atravessados pela linguagem. Se na obra freudiana podemos encontrar o Isso (Id, em traduções mais antigas) na segunda tópica, como o reservatório das pulsões no qual está mergulhada a parte inconsciente de nosso Eu, em Groddeck, criador do termo, o Isso é anunciado como uma força pela qual somos vividos, enquanto nós acreditamos viver . O Isso não apenas nos impulsiona em direção ao desejo, mas também é fonte de mal estar quando estamos em desacordo com ele. Daí advém sintomas, doenças, passagens ao ato e repetições, entre outras manifestações da vida pulsional cerceada, o que leva as pessoas geralmente a procurarem médicos e outros profissionais de saúde, que muitas vezes não sabem ao certo que estão lidando com Isso. Trabalhos recentes no meio científico têm procurado resgatar as ideias de Georg Groddeck, particularmente a noção d’Isso segundo o autor. Quais suas implicações para a clínica contemporâ

O que faz um psicanalista?

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Falar sobre a formação de um psicanalista, partindo das especificidades da Psicanálise, passa certamente pelas características marcantes do tripé dessa formação, a saber, análise pessoal, supervisão e transmissão (ensino). Todavia, considerando que o tema já foi abordado neste blog , assim como tem sido, felizmente, debatido com bastante frequência pelos mais diversos psicanalistas e instituições dedicados a uma formação psicanalítica responsável, devidamente implicada e atravessada pelos princípios freudianos, minha ideia no presente artigo, ao buscar respostas para a pergunta com a qual o intitulei, é trabalhar sobre um aspecto da formação que habitualmente fica em suas entrelinhas.  O que faz, afinal, um psicanalista? De início, constatamos que há duas leituras possíveis para nossa pergunta: uma leitura mais óbvia, que trataria diretamente do ofício do psicanalista, ou seja, do que ele faz em sua prática, de como ele atua, e outra leitura, na qual pretendo me aprofundar aqui, que pe

Mitos e verdades sobre a terapia psicanalítica

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Muitas pessoas têm dúvidas e desconfianças relacionadas à psicanálise, algumas vezes simplesmente por medo de algo que desconhecem, noutras em consequência de depoimentos falaciosos sobre esse tipo de abordagem, geralmente proferidos por quem nunca viveu a experiência. Minha proposta no presente artigo é esclarecer pontos importantes relativos à terapia psicanalítica, utilizando uma linguagem fácil, pensando também em acessar quem é leigo ou iniciante no assunto. Ao terminar sua leitura, fique à vontade para usar o espaço dos comentários e me contar se consegui atingir o objetivo. Vamos começar pelo título escolhido, que traz propositalmente uma pequena polêmica: a psicanálise é ou não é um tipo de terapia? Em diversos de seus escritos, Freud disse que sim. Considerando que foi ele quem criou a psicanálise, penso que não seja necessário nos debruçarmos tanto sobre essa questão. Respeito os colegas que preferem dizer que a psicanálise é outra coisa (práxis, método, técnica, processo, ex

Um nome para a dor: fibromialgia

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Há bastante tempo a Medicina se depara com o desafio de enfermidades que afetam o corpo sem, no entanto, haver doença orgânica que explique seus sintomas. Se na época de Freud o protótipo dessas enfermidades era a histeria, na pós-modernidade elas se apresentam com inúmeras variações, entre as quais a fibromialgia é uma das mais conhecidas. Embora os sofrimentos e as dores de pacientes fibromiálgicos sejam reais, não é incomum que careçam de legitimidade ou sejam de algum modo desvalorizados quando abordados pelo modelo de atendimento médico centrado na doença.  Entendendo a fibromialgia como um campo problemático e complexo, o grupo de estudos Psicossomática Florianópolis propôs neste encontro um olhar ampliado sobre o tema, a partir de diálogos entre áreas de atuação diversas. Iniciamos com as falas de um médico, um fisioterapeuta e uma psicanalista, articulando seus pontos de vista e experiências clínicas a respeito de pessoas com fibromialgia. Em seguida, os demais participantes ta

Considerações sobre a formação do psicanalista

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Recentemente no Brasil, com o surgimento de uma proposta indecorosa para que fossem criados cursos regulamentados de “graduação em Psicanálise”, voltou à cena o debate público sobre a formação do psicanalista. Diversas instituições, respeitadas por sua tradição na transmissão da Psicanálise, uniram-se para publicar um manifesto contrário à tal proposta, embasadas pelos ensinos dos mestres Sigmund Freud e Jacques Lacan. Mas afinal, se não é através de uma graduação, como se forma um analista?  Penso que uma forma de iniciar a resposta dessa questão seja apresentando diferentes aspectos do psicólogo e do psicanalista, pois é comum as pessoas confundi-los, particularmente o público leigo. E talvez seja justamente essa confusão que leve alguns a terem a ideia equivocada de que seria necessário regulamentar a Psicanálise, tendo em vista que a Psicologia o é. Embora ambos, psicólogo e psicanalista, trabalhem em prol da saúde mental (e consequentemente também da saúde física), há algumas dif