Hipertrofia de adenoides: uma defesa exagerada

Um menino de 4 anos de idade se apresenta com respiração bucal predominante. Os pais observam que ele ronca muito e dorme com a boca aberta, algo que favorece infecções de repetição nas vias aéreas. Preocupados, vão à procura de ajuda médica e logo na segunda consulta, frente ao resultado de uma radiografia do cavum do filho, lhes é sugerida a adenoidectomia (retirada cirúrgica das adenoides) como promessa de solução para os problemas apresentados. Será mesmo?

Avaliar e tratar uma criança com as características descritas acima por certo não é uma tarefa tão simples como muitos pais e médicos gostariam. Implica investigar o desenvolvimento neuropsicomotor e também o contexto familiar no qual o paciente está inserido, pois dificuldades dos pais sempre reverberam sobre os sintomas de seus filhos. Não raro a adenoidectomia configura-se uma mutilação desnecessária, pois seus benefícios são bastante questionáveis, embora muitos otorrinolaringologistas provavelmente se apressem em dizer o contrário.

A evidência atual sobre o efeito da adenoidectomia em sintomas nasais recorrentes ou crônicos ou obstrução nasal isolada é esparsa, inconclusiva e tem um risco significativo de viés, de acordo com revisão da Cochrane. Ensaios de alta qualidade que avaliem a eficácia da adenoidectomia em crianças com sintomas nasais recorrentes ou crônicos deveriam ser iniciados antes que a cirurgia fosse indicada como alternativa de tratamento para essa população pediátrica.

Na anatomia normal, os portões superiores da entrada do organismo humano são bem protegidos pelo chamado anel de Waldeyer, uma fortaleza imunológica que conta com adenoides e tonsilas palatinas, consiste essencialmente em tecidos linfáticos e impede que corpos estranhos nocivos à saúde adentrem nosso corpo. Com frequência essa estrutura causa problemas em função de respostas imunológicas excessivas, as quais se tornam perceptíveis, por exemplo, pela hipertrofia das adenoides e tonsilas.


No entanto, o fato de que as adenoides estejam hipertrofiadas em determinado paciente não significa que tais estruturas tenham pouca importância e possam ser simplesmente extirpadas. Opera-las é uma forma de atuar muito comum dentro do paradigma médico dominante, mas reflete certa preguiça de pensar. Diante de uma estrutura de defesa hipertrofiada, o mínimo necessário é compreender contra o que a criança está se defendendo com tamanha intensidade.

Nos dias atuais costuma-se submeter as crianças a um excessivo número de vacinas, o que parece uma boa suspeita a ser considerada para a reação imunológica exacerbada, mas há também outras vias para se estudar o problema. Pediatras antroposóficos, por exemplo, partem do princípio de que nas crianças afetadas pelas hipertrofias supracitadas ocorre uma discrepância entre o crescimento psíquico e aquele físico. O corpo então mostra um crescimento excessivo local que substitui um desenvolvimento psíquico ausente ou insuficiente. Os órgãos de defesa ampliados (hipertrofiados) indicam que é necessário, por exemplo, a criança aprender a defender-se do ponto de vista psíquico e desenvolver autonomia.

Procurar respostas para as questões que se colocam na presente reflexão, obviamente é algo desafiador, que pede tempo e atenção do profissional de saúde, contextualizando cada paciente de modo singular. Além disso, trata-se de uma situação perturbadora aos pais ou responsáveis da criança, pressupondo que estejam interessados em encarar o cerne do problema, uma vez que necessariamente demandará transformações nesses adultos envolvidos com o cuidado do pequeno ser humano (sujeito) em desenvolvimento.


Comentários

  1. EVIDÊNCIAS E REFERÊNCIAS:
    1. van den Aardweg MTA, Schilder AGM, Herkert E, Boonacker CWB, Rovers MM. Adenoidectomy for recurrent or chronic nasal symptoms in children. Cochrane Database of Systematic Reviews 2010, Issue 1. Art. No.: CD008282. DOI: 10.1002/14651858.CD008282. Disponível em: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/14651858.CD008282/abstract [acesso em 04 ago 2017].
    2. Dahlke R, Kaesemann V. A doença como linguagem da alma na criança: Interpretação e significado de quadros clínicos e seu tratamento holístico. São Paulo: Cultrix; 2014.
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    Imagens da postagem obtidas livremente nos seguintes endereços eletrônicos:
    http://www.roteirokids.com.br/site/wp-content/uploads/2012/11/caminha-sozinha.jpg
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    [acesso em 07 ago 2017]

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